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Dossiê IPHAN - "Tambor de crioula"

Imagem reproduzida do Dossiê

Continuando a falar de música, desta vez da cultura folclórica brasileira, sigo o caminho aberto pela postagem do Dossiê Viola de Cocho para apresentar à vocês mais um importante livro, grátis para download, produzido pelo IPHAN, sob coordenação de Rodrigo Ramassote: o Dossiê tambor de crioula.



O Tambor de Crioula hoje e há 30 anos

Em 1977/78 uma equipe de jovens da Fundação Cultural do Maranhão (FUNCMA), interessados em conhecer a cultura popular maranhense, realizou pesquisa sob nossa coordenação a propósito da manifestação cultural do Tambor de Crioula, que teve uma pequena edição publicada
em 1979 pelo Serviço de Obras Gráficas do Estado (SIOGE).

Em 1981 foi publicada uma edição resumida no número 31 dos Cadernos de Folclore do Instituto Nacional de Folclore INF/FUNARTE/MEC, junto com um disco compacto, na Coleção de Documentário Sonoro do Folclore Brasileiro da Comissão Brasileira de Defesa do Folclore. 

A pesquisa contou com o incentivo do folclorista Dr. Domingos Vieira Filho, então presidente da FUNCMA, e foi realizada com apoio financeiro do INF. Participaram ativamente da pesquisa os técnicos Rodão Lima e José Valdelino Cécio, prematuramente falecidos, além de Joila Moraes, Joaquim Santos Neto e Murilo Santos e um grupo de estudantes estagiários. Um dos objetivos da pesquisa era coletar documentação para o acervo do futuro Museu de Folclore do Maranhão, planejado então por Dr. Domingos, que se transformou depois de sua morte no Centro de Cultura Popular Domingos Vieira Filho da Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão. Em 1995 e em 2002 a Comissão Maranhense de Folclore (CMF), com apoio da SECMA, publicou uma segunda e depois uma terceira edição revista do livro.

Nas décadas de 1990 e na atual, o tema do Tambor de Crioula continua despertado o interesse crescente entre jovens estudiosos que redigiram monografias de conclusão de cursos de graduação ou dissertação de mestrado e têm publicado artigos e comunicações em números do Boletim da CMF. A partir de 1990 notamos um interesse crescente da juventude maranhense e das autoridades da área de cultura popular em relação ao Tambor de Crioula, em função do interesse turístico, mas decorridos quase trinta anos da realização daquela pesquisa, pouca coisa tem sido publicada até hoje sobre o assunto, o que lamentamos.

A Missão de Pesquisa Folclórica organizada por Mário de Andrade, através do Departamento de Cultura da Prefeitura Municipal de São Paulo, esteve em São Luís em 1938 e coletou material pioneiro sobre Tambor de Crioula, Tambor de Mina, Bumba-Meu-Boi e Carimbó. Parte deste material foi publicado por Oneyda Alvarenga em 1948 e atualmente continua sendo publicado pelo Centro Cultural São Paulo que preserva o acervo então coletado.


Caixeiras da Festa do Divino Espírito Santo.
Imagem reproduzida do Dossiê

Comparando-se as pesquisas realizadas em 1938, em 1978 e atualmente, notamos que hoje se tem ampliado o número de participantes, o interesse por esta manifestação e o conhecimento sobre suas características e diferenças nas diversas regiões do Estado. Paralelamente às transformações que ocorrem na sociedade e neste aspecto da cultura popular, o Tambor de Crioula continua sendo uma forma de divertimento e de pagamento de promessa de setores populares da sociedade, em homenagem a São Benedito e a diversas entidades sobrenaturais cultuadas nos terreiros de Tambor de Mina e de Umbanda, como os Pretos Velhos e outras entidades, no dia 13 de Maio nos terreiros do Maranhão.

Nossa pesquisa trouxe importantes contribuições em relação às letras e à música do Tambor de Crioula, que foram coletados e analisados na época por Valdelino Cécio e Joaquim Santos, sendo revistos na segunda edição, por Joaquim Santos com a colaboração de Francisco Pinheiro e de Patrícia Sandler. Até aquela época, muitos afirmavam que as letras dos cânticos de Tambor de Crioula constituíam um conjunto de palavras sem nexo, e a pesquisa demonstrou que havia poesia e sentido nas palavras dos cânticos, que podiam ser classificados, como fez Valdelino Cécio, em diferentes temas como: a auto-apresentação, saudações, cumprimentos, auto-elogio, reverências a santos e entidades protetoras, descrição de fatos, recordação de situações, pessoas e lugares, sátiras, recordações amorosas, desafios, despedidas, etc. Constatamos com Joaquim Santos que a música do Tambor de Crioula possui estilo muito próximo às raízes mais antigas da cultura afro-maranhense, por isso pessoas de fora dos grupos não aprendem facilmente a tocar, cantar e dançar.

As palavras dos cânticos não são de fácil compreensão para pessoas fora dos setores da classe social que participam de sua realização, devido ao sotaque com que são pronunciadas, à existência de regionalismos, de palavras arcaizantes e pela própria impostação vocal.


Em 1978 havia menos de vinte grupos de Tambor de Crioula em São Luís, hoje há mais de sessenta grupos cadastrados nos órgãos de registros da cultura popular na capital. O Tambor de Crioula continua vivo e muito atuante no Maranhão. Os temores na época de nossa pesquisa, de que a influência do turismo poderia contribuir para a descaracterização desta brincadeira, felizmente não se concretizaram, embora traga transformações, como não podia deixar de ocorrer. Mestre Felipe do Coroadinho que foi um dos importantes informantes da pesquisa em 1977, continua atuante ainda hoje como um dos grandes líderes desta manifestação em São Luís.


Festa do Divino Espírito Santo.
Imagem reproduzida do Dossiê

Em boa hora, atualmente a Prefeitura Municipal de São Luís, através de sua Fundação Cultural e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, pela Regional do Maranhão, estão interessados na atuação e na coleta de documentos sobre o Tambor de Crioula. Novas pesquisas estão sendo realizadas e novos trabalhos devem ser em breve publicados, ampliando a análise e a compreensão do tema.

Nos últimos anos tem havido grande interesse, entre outros aspectos, nas possíveis relações entre o Tambor de Crioula e a luta da Capoeira, a que nos referimos brevemente em passagens daquela pesquisa. Tem havido igualmente interesse nos aspectos eróticos e sexuais da dança, em seus aspectos especificamente religiosos, em sua diversidade nas diferentes regiões do Estado, nas relações com o turismo e com as políticas culturais. Esperamos que as novas pesquisas e trabalhos que estão e que venham a ser realizados contribuam para o esclarecimento destes e de outros assuntos relacionados com o Tambor de Crioula.

O trabalho de pesquisa realizada em equipe, apesar das dificuldades de coordenação, contribuiu para que vários aspectos dos cânticos, das músicas, das danças, bem como elementos religiosos, comerciais, regionais e de política cultural, fossem apresentados e discutidos. Hoje novos aspectos precisam ser descobertos e analisados por outros pesquisadores e esperamos que o quanto antes sejam escritos e publicados novos trabalhos sobre o Tambor de Crioula do Maranhão e que a publicação pelo IPHAN de Os Tambores da Ilha suscite novos trabalhos sobre o Tambor de Crioula do Maranhão.

Sergio Ferretti
São Luís, MA, novembro de 2006


Imagem disponível em Paulica Santos


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