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SÉRIE: Os Últimos Czares [resenha]




Na Netflix há a série entitulada Os Últimos Czares, muito boa mas que, ao mesmo tempo, merece algumas palavras a respeito.

A produção é ótima, a fotografia é muito interessante, o elenco faz um trabalho que vale destacar. Tudo isso para contar a história de Nicolau II, o último czar russo da dinastia Romanov, desde sua coroação em 1894 até sua execução em 1918. 

A série meio ficção meio "verdade" segue uma ordem cronológica, tem um ar de documentário, intercalando uma encenação sobre a investigação a respeito da possível filha sobrevivente de Nicolau, Anastácia, com a "reconstituição" dos fatos sobre o Imperador, sua família, a revolução que aconteceu no país, a interferência de personagens históricos, sobretudo o misterioso e controverso Rasputin, até, finalmente, a execução da família real. 



A verdadeira família real

Para que a mesma ganhasse vida, contou-se a direção de Adrian McDowall (vencedor do BAFTA de Melhor Curta-Metragem por Who's My Favourite Girl?) e Gareth Tunley (também indicado ao mesmo prêmio por The Ghoul, em 2016). No elenco de atores, Ben Cartwright (de Sherlock Holmes) atua como Rasputin; Duncan Pow (de Black Mirror) como Yakov Yurovsky; Oliver Dimsdale (o Príncipe de Gales no episódio de Natal de Downtown Abbey) como Pierre. Entre os protagonistas, Susanna Herbert interpreta a imperatriz Alexandra e Robert Jack (de Gary Tank Commander) assume a pele de Nicolau II.

Para completar, seguindo modelos de produção que vêm tendo sucesso, são acrescentados depoimentos de historiadores, entre os quais especialmente de Simon Sebag Montefiore — autor do livro Os Romanovs — e Douglas Smith — que lançou há pouco tempo uma biografia de Rasputin —. Essa participação de historiadores  na minha opinião, claro , não torna a série massante, mas, pelo contrário, enriquece a produção e a torna mais viva.



Alexandra e Nicolau

Sei que você deve já estar perguntando: mas, afinal, o seriado é bom ou não é? E ele agrada a quem? 


Em resposta a essas duas perguntas, evidentemente que poderíamos fazer uma discussão filosófica, artística e estética — desnecessária aqui (rs) — sobre o que seria um "bom seriado" e mesmo sobre o que significa ser "bom" ou "ruim". Mas, como não queremos isso, podemos dizer apenas o seguinte: o seriado agrada a muitos olhares, desde de quem gosta muito de História até às pessoas que só querem ver cenários incríveis, glamour, gente rica, fina e elegante; agrada também a quem gosta de drama; ao mesmo tempo, a quem quer ver um pouco da realidade do restante da Rússia, dos excluídos, dos camponeses pobres e miseráveis. Se você é apenas um curioso descompromissado, vale a pena parar para ver os 6 episódios que focam nos últimos Romanov no poder — dá até pra maratonar, com direito a pipoca e leite quente (se ainda estiver frio na sua cidade, claro).


Bom, se era isso que você queria saber, a postagem já acabou (rs). Mas, contudo, entretanto, porém... se quer ir um pouco mais a fundo, continue lendo os parágrafos que seguem, que quero falar sobre alguns pontos que acho que são importantes.



Rasputin e Alexandra

Se você é como eu que gosta de ver os erros e defeitos das coisas, porque não se contenta com tudo perfeitinho, bonitinho, "em seus devidos lugares", o seriado tem que ser visto com cuidado. Existem incorreções e existem mesmo inverdades no seriado. Existem, enfim, pontos sensíveis, que precisam ser pensados com calma. Não vou falar de todos, mas apenas de alguns.


Entre as imperfeições mais gerais e as incorreções da série, poderíamos citar a sua "americanização", onde as falas no original são quase todas em inglês, além de os personagens demonstrarem sentimentos e formas de expressão que não são típicos dos habitantes da Eurásia em geral. Essas coisas podem parecer inofensivas para muita gente, mas não são. 


Em primeiro lugar, isso pode confundir, pode criar uma sensação de que o mundo é todo igual, de que os russos (e as centenas de povos das diferentes regiões do Império Russo) naquela época não tinham singularidades, não tinham cultura própria, não tinham tradições próprias, "eram todos como nós". Além disso, pode passar uma mensagem e criar uma representação das pessoas, identidades, comportamentos, coisas e eventos, nem sempre transparentes e/ou mesmo distorcidos. Podemos pensar conosco que os nossos "óculos" ocidentais nos permitem de fato entendê-los de uma forma que, na verdade, não condiz com o que "realmente são". Nesse ponto um erro duplo poderia ser cometido, o de olhar com os olhos de hoje (anacronismo) e o de olhar com os olhos do Ocidente. Nesse último caso, sabemos que as monarquias eram "multinacionais", que os reis da Europa tinham parentesco e que casavam com membros das famílias reais de outros países (Alexandra era alemã, por exemplo), mas isso não pode nos levar a crer que eram todos iguais. Pra entender essas últimas diferenças pode ajudar pensando o seguinte: nem meus pais e nem meus irmão são iguais a mim, quanto menos meus parentes a medida ficam em graus mais distantes.



A família real pouco antes de ser fuzilada

Agora, uma outra coisa muito importante a se perceber em Os últimos Czares é que ele é muito romanceado, as falas dos personagens principais são muitas vezes suavizadas, mesmo em momentos tensos e decisivos, o que pode desviar a atenção e distorcer alguns fatos históricos. Embora mostre os massacres promovidos voluntária ou involuntariamente por Nicolau II, com o passar dos episódios, a tendência é suavizar a sua imagem, deixando a impressão de que, no fundo, ele não teve culpa de nada, porque era influenciado ora por conselheiros da aristocracia russa, ora pelo religioso siberiano Rasputin, ora por sua mulher. Até parece em alguns momentos que o czar não tinha voz pra nada, era um completo "pau mandado". 


Embora essas impressões possam ser verdade até certo ponto, não podemos inocentar o czar — e mesmo a cúpula da família real , afinal, pelas mortes dos camponeses que foram em peso à sua coração, esperando ganhar "presentes", ou ainda dos muitos manifestantes que foram massacrados no Domingo Sangrento de 1905. Isso sem falar nos erros constantes cometidos por ele, que levaram à morte de milhões de soldados  quase sempre mal preparados, mal equipados e maltratados  desde a guerra com o Japão (1905) até os trágicos anos em que a Rússia permaneceu na Primeira Guerra Mundial (1914-1917). 



Nicolau II

Assim, independentemente do "lado" político que se assuma e das críticas que se possa fazer aos rumos e ao grau de radicalismo que as manifestações e movimentos de contestação tomaram, culminando na revolução e no controle posterior dos bolcheviques, quem tem um pouco de consciência histórica deve concordar que as ações de Nicolau e de sua corte, ignorando os apelos do povo, camponeses sobretudo, preferindo reprimi-los, por vezes severamente, quando deveriam ponderar e atender minimamente suas súplicas, levou a Rússia aos eventos que se sucederam: desde a instauração da Duma, passando pela Revolução  de 1917 até chegar à vitória dos bolcheviques na Guerra Civil - o que inclui o fuzilamento da família real. 


Mas, enfim, deixemos essas questões, que envolvem paixões e pontos delicados, para outra postagem ou mesmo para os comentários de vocês, porque acho que me delonguei demais.


livro rasputin
Douglas Smith 

Assista ao trailer


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Guerra Fria segredos

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