Historiadores em Perfil: José Murilo de Carvalho

José Murilo de Carvalho está entre os grandes cientistas políticos e historiadores do Brasil. Foram muitas as suas contribuições para a compreensão do Império e da República, somada ainda a importante questão da cidadania.

José Murilo de Carvalho nasceu 10 de setembro de 1939, Andrelândia, Minas Gerais, e faleceu recentemente no Rio de Janeiro. Ele era sendo o segundo filho (dentre dez) do cirurgião dentista Sebastião Carvalho de Sousa e de Maria Angélica Ribeiro.

Ele fez Seus primeiros estudos aconteceram em casa, tendo depois aos dez anos sido internado num seminário de franciscanos holandeses, que ficava no município de Santos Dumont.

Já sua carreira acadêmica não começou pela História, o que pode incomodar alguns "puritanos" da área. Na UFMG ele fez o curso Sociologia e Política. De lá rumou para a universidade norte-americana de Stanford, onde fez mestrado e doutorado. O tema de sua tese de doutorado, orientada por Robert A. Packenham, foi Elite and state-building in imperial Brazil (em tradução livre, Elite e construção do Estado no Brasil Imperial).

Dois ano depois de terminar o doutorado, já na Inglaterra, ele concluiu seu pós-doutorado pela London University.

Toda essa sua formação, entre 1965 e 1977, ele fez num período em que o Brasil vivia sob o regime militar, com forte controle sobre as universidades, sobre as pesquisas e os cursos de Humanas.

Ainda assim, sua atuação como professor começou na UFMG, onde ficou por quase 20 anos. Mas não ficou só nela, tendo sido professor visitante em diversas universidades do mundo. Passou pela própria Stanford, onde fez pós-graduação como vimos, também por California-Irvine, Notre Dame (Estados Unidos), Leiden (Holanda), Londres e Oxford (Inglaterra) e na École des Hautes Études en Sciences Sociales (França). Ele foi Fundação Casa de Rui Barbosa entre 1986 e 1996.

Desde 1997 ele era professor titular de História do Brasil na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

José Murilo foi premiado por diversos de seus trabalhos, no Brasil e no exterior e reconhecido por suas muitas contribuições. Ele também foi sócio titular do IGHB (Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro) e fez parte da Academia Brasileira de Letras, onde se tornou um de seus imortais.

Não é exagero elogiar José Murilo por suas contribuições. Foram anos dedicados aos estudos da realidade brasileira, especialmente sobre o Brasil Império, a consolidação (ou a falta dela) da República e as questões envolvendo a cidadania em nosso país. Ele estudou as Forças Armadas, assim como dava aulas na Escola de Guerra Naval desde 2004.

Ele também se dedicou a estudar figuras tidas como ilustres na nossa história, sempre analisadas com seriedade e viés críticos, não ufanista. Assim que ele lançou livros sobre Visconde do Uruguai, Paulino José Soares de Sousa, Bernardo Pereira de Vasconcelos e Dom Pedro II.

Ele também deu espaço em seus estudos para personagens femininas, como a multifacetada Rachel de Queiroz e Jovita Alves Feitosa, a Voluntária da Pátria.

Dele sairam importantes contribuições para a compreensão das ideias e ideologias que disputavam espaço no período de constituição da república, desde o Positivismo até o socialismo. Inserindo em suas análises a participação popular (ou a falta delas), em contextos pouco democráticos, onde o voto era desacreditado e as eleições eram meras formalidades elitistas.

Foi destaque sua análise da Revolta da Vacina, assim como o alheiamento popular quando da proclamação da República no Brasil. Fatos que mostraram que o povo estava longe da política, voluntária e involuntariamente. Aliás, essas análises abriram caminho também para que José Murilo pudesse pensar a questão da cidadania e como esse conceito foi mudando com o tempo. Cidadania frágil, ainda mais cerceada em tempos de Ditadura, que viu renascer uma esperança com a volta da democracia a partir de 1989 e da promulgação da Constituição Cidadã.

Em meio a tudo isso, sairam livros importantes, dos quais devemos destacar Os Bestializados (1987), Teatro de Sombras (1988), A Formação das Almas (1990) e Cidadania no Brasil (2001). Todos eles estão disponíveis, lembrando que se adquirir qualquer um deles (clicando no título) você ajuda a manter os meus projetos (blog e canal).

Como últimas palavras sobre ele, podemos dar voz à Norma Cortes que diz que

Sua formação e trajetória (diversamente dos grandes intérpretes do Brasil que o precederam), estão fortemente marcadas pelo vertiginoso e acelerado processo de consolidação do atual sistema universitário brasileiro, i.é: pela democratização do acesso ao ensino universitário, pela crescente especialização e departamentalização dos saberes científicos e pela conformação dos núcleos de pesquisa nos programas de pós-graduação — fato que o notabiliza tornando-o um legítimo representante da moderna geração de intelectuais brasileiros.

Bom, por enquanto é isso. Caso queira saber mais sobre esse autor, existem alguns textos biográficos, dentre os quais um breve que foi lançado por Norma Cortes, que, aliás, lançou com José Murilo o livro República, povo e cidadania. É possível também encontrar diversas resenhas dos livros dele, como a que fiz para o canal sobre o Os Bestializados, além de entrevistas em formato de texto e mesmo em vídeo do Youtube.

Os livros desse autor

(clique no título para ver mais a respeito)

A Escola de Minas de Ouro Preto: o peso da glória, 2002

A construção da ordem: a elite política imperial, 1980

Os bestializados: o Rio de Janeiro e a República que não foi, 1987

Teatro de sombras: a política imperial, 1988

A formação das almas: o imaginário da República no Brasil, 1990

Un théâtre d'ombres: La politique impériale au Brésil, 1990

A monarquia brasileira, 1993

Desenvolvimiento de la ciudadania en Brasil, 1995

Pontos e bordados: escritos de História e Política, 1999

Bernardo Pereira de Vasconcelos, 1999

Cidadania no Brasil: O longo caminho, 2001

Visconde do Uruguai, 2002

Forças Armadas e Política no Brasil, 2005

Dom Pedro II, 2007

Histórias que a Cecília contava, 2008

A Academia Brasileira de Letras, subsídios para sua história (1940-2008), 2009

Rachel de Queiroz, 2010

O Pecado Original da República, 2017

Clamar e agitar sempre: os radicais da década de 1860, 2018

Jovita Alves Feitosa Voluntária da Pátria, Voluntária da Morte, 2019

Livro destaque desse autor:

Os bestializados

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Assista a resenha do livro Os bestializados!