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Bernie Sanders anuncia uma Nova Era Político-Partidária nos Estados Unidos | Cristiano Abreu Mestre em História Econômica pela Universidade de São Paulo




Os jogos estão na mesa, Bernie Sanders está no páreo. Mas o que isso representa? O que isso tem a ver com o passado dos EUA? Em que sentido ele abala o presente? 

Podemos afirmar que Bernie Sanders já é um abalo histórico no quadro político dos Estados Unidos, não só no Partido Democrata, mas no próprio bipartidarismo institucional dos EUA. Sendo ele indicado pra concorrer pelos democratas ou não.

Sanders é perigoso para a velha máquina partidária democrata (dominada por clãs, como: Kennedy, Clinton...): caso ele vença, será uma perda da tradicional oligarquia democrata sobre o controle do partido. Mas se ele perder pode ser talvez ainda mais perigoso. Pois é possível que haja um racha nos democratas, nascendo um partido Social-democrata. Seria uma crise com um terceiro partido nascendo, como só ocorreu duas vezes nos Estados Unidos. A primeira vez foi no surgimento dos republicanos de Abraham Lincoln, que furou o sistema partidário de então: depois de 6 anos da fundação do Partido Republicano (1854), eles já venceram a presidência frente os democratas (que racharam na eleição de 1860) e o Whig Party (Partido Liberal), que em parte foi absorvido nos republicanos.

O GOP (Grand Old Party), o Partido Republicano, nasceu abolicionista e protecionista, pró altas tarifas alfandegárias, em 1854. Para ganhar a presidência já em 1860, contra os rachados democratas de então. Os republicano não propunham a abolição nos estados que a tinham, mas defendiam a proibição da expansão da escravidão nos territórios federais. Os democratas racharam sobre a defesa ou não da expansão da escravidão nos territórios federais, tomados do México na Guerra EUA-México (1946-1948). Os democratas do norte defenderam a linha da soberania popular nos territórios: conforme fossem virando estados, a população decidiria no voto se seria um free state ou slave state, e lançaram o senador Stephen A. Douglas, de Illinois, para presidente. 

Os democratas do sul racharam, defendiam que o sul é que havia tomado os territórios do México e que então todos os territórios seriam slaves states. Laçaram o vice-presidente, do presidente  Buchanan (1852-1860), John C. Breckinridge de Kentucky para a presidência. Uma facção whig também lançou candidato. Ganhou o republicano Abraham Lincoln, para iniciar uma era de hegemonia republicana com a vitória da União na Guerra Civil (1861-1865), que duraria até 1912. 

O outro racha partidário ocorreu durante a hegemonia republicana, com a fundação do People's Party, no fim do séc. XIX. O Partido Republicano, o histórico partido popular e abolicionista de Lincoln, tornou-se, rapidamente após a Guerra Civil, o oligárquico partido do Big Business. Não era mais o partido papelista defensor da barata moeda fiduciária Greenback dos dias de Lincoln e Grant. E levado o país depois a entrar no padrão-ouro a partir de 1879, dificultando a vida dos pequenos produtores, devedores e agricultores. Dessa revolta pró greenback, moeda fiduciária, ou pela monetização da prata (do grupo free silver currency), houve um levante populista nas décadas de 1880 e 1890, com Greenback Party, outros partidos menores, e, sobretudo, o People’s Party: partido orgulhosamente Populista, contra a hegemonia financeira dos Robber Barons, que os republicanos haviam se tornado. Os republicanos eram ao fim do século XIX quase um partido que poderia ter o Tio Patinhas como símbolo (ícone da Disney criado depois, mas ironizando esse período de hegemonia republicana nos EUA).

Na histórica eleição de 1896, na qual o levante popular contra o padrão-ouro chegou ao cume, os populistas ganharam a indicação dos democratas, com William Jennings Bryan e sua pauta de greenbackism, transformado em defesa da prata ou do bimetalismo... contra a Cruz de Ouro em que estavam crucificando o Povo. Apesar de seus discursos audaciosos e inflamados, a tergiversação entre “qual saída contra o padrão-ouro” (prata, papel, bimetalismo..) o enfraqueceu, e ele perde a eleição para o republicano William McKinley (William Jennings Bryan teria sido a inspiração para o Leão Covarde no Mágico de Oz). 

O People's Party não vingou, apesar de ter causado muita agitação. Seu protesto contra as oligarquias financeiras, o capitalismo monopolista oligárquico, simbolizado nos preços cartelizados dos fretes ferroviários, estaria na base do New Deal.  Com os democratas regulamentando fortemente o capitalismo selvagem e salvando o capitalismo dele próprio. 

Hoje Sanders invoca esse histórico, alavancado por uma juventude desesperançada com o atual Capitalismo. Juventude que quer empregos e salários melhores, e uma vida melhor. Seja QUAL FOR O NOME DO SISTEMA. O nome não importa: capitalismo monopolista regulado, socialismo democrático... Tanto faz o nome: Sanders representa essa onda, exigindo que como está não dá mais.

Veremos como seguirá essa História... Se Sanders reformará o Capitalismo como no New Deal (ele cita muito e invoca um Green New Deal para o governo que quer fazer), se ele será mais para um Lincoln revolucionário num país dividido, ou se uma possível divisão dos democratas em 2020 ajude os republicanos (como em 1860), ou ainda se Sanders será como o ”Leão Covarde” William Jennings Bryan, que levou a indicação democrata como um radical, inspirou paixões políticas... mas se derreteu historicamente. As portas da História estão abertas para o fenômeno Sanders. Mas parece claro que, o que quer que ocorra, Sanders já representa um Novo Momento histórico na estrutura político-partidária dos Estados UnidosEntre Lincoln e o "leão covarde" qual será a herança de Sanders...? Não sabemos. Mas sabemos que ele já mudou o quadro político dos EUA.


Cristiano Addario de Abreu é Mestre em História Econômica pela Universidade de São Paulo, com Doutorado em andamento na mesma Universidade.


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** Originalmente postado em 26/dez/2012.

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