Carlo Ginzburg, nascido em 1939 - alguns meses antes do início da Segunda Guerra Mundial -, era de ascendência judia, filho de Natalia Ginzburg e Leone Ginzburg, que se tornariam importantes membros da resistência antifascista italiana. O pai morreu em uma prisão fascista nos anos finais da guerra, quando Carlo tinha cinco anos; a mãe, por outro lado, sobreviveu e seguiu sua carreira como importante escritora.
Ele quis ser literato, romancista como a mãe, e pintor, mas acabou desistindo dessas ideias e se enveredando pela História. Seu interesse pela mesma se deu, entre outras coisas, por influência do próprio pai que lia livros de não-ficção para ele quando criança; mas sobretudo, a partir da adolescência, por influência de importantes historiadores, especialmente italianos, como Delio Cantimori, estudioso pioneiro dos heréticos italianos do século XVI. Sua ligação com Cantimori aconteceu quando estudava na Scuola Normale de Pisa, onde o conheceu pessoalmente. Sobre seu primeiro contato com o mesmo, como ele próprio diz em entrevista à historiadora Maria Lúcia Pallares-Burke, que faz parte do livro As Muitas Faces da História, "ainda me lembro vividamente da impressão que me causou aquele professor de barbas brancas e vestido num estilo do século XIX. Lembro-me de pensar que aquele era o homem mais velho que já vira".
Mas, academicamente falando, Ginzburg procura mostrar como Menocchio, um letrado em meio a tantos analfabetos, procurou se expressar, ser um porta-voz das pessoas comuns, daqueles que tinham que aceitar sempre os dogmas da igreja. Com esse livro, o autor também seguiu na direção da chamada "história vista de baixo" e também - o que estava muito em voga na época - da Antropologia Histórica. Esse livro representou, por fim, um marco para que Ginzburg se estabelecesse como um dos líderes da micro-história.
Além desse livro, a micro-história se tornaria especialmente popular justamente a partir dos trabalhos seguintes de Carlo Ginzburg e também de Giovani Levi. Uma série de livros com o título "micro-história" seriam editados por eles e publicados pela editora Einaudi - editora que o pai havia ajudado fundar décadas atrás.
Outros livros (e artigos) de Ginzburg, embora mantenham à vista os personagens e objetos de conhecimento histórico, caminham no sentido de analisar o ofício do historiador, suas práticas de pesquisa, seus paradigmas, seus "traços" de detetive, seu diálogo diverso sobre temas diferentes. Isso ocorre, por exemplo, na coletânea de ensaios Mitos, Emblemas, Sinais, onde Ginzburg constrói o paradigma de um "saber indiciário", um método de conhecimento cuja força está na observação do pormenor revelador, mais do que na dedução.
Em resumo poderíamos dizer, sem querer limitar, que Carlo Ginzburg sempre deu e dá (no sentido presente, porque ele segue muito ativo) atenção aos pequenos, aos de baixos, ao micro, sem esquecer do macro, das paisagens em que os seus personagens (individuais ou em pequenos grupos) se inseriam, sem esquecer dos contextos. Num diálogo com os franceses, especialmente os da Nova História, ele aponta o que pra ele é a insuficiência das análises macro para explicar o concreto, a minúcia, o local. Mas não perde de vista o amplo: pra esse volta recorrentemente, sempre recorre-lhe, embora nele não se limite. Em resumo, para Ginzburg não há oposição entre o amplo e o específico - e mesmo o "periférico" -, "a ideia de se opor a chamada micro-história à macro-história não tem sentido, assim como também é absurda a ideia de se opor a história social à história política".
Carlo Ginzburg tem tido uma vida bastante ativa, tendo lecionado em importantes universidades, especialmente na Itália e nos Estados Unidos. Já passou pela Universidade de Bolonha, em seguida, nas universidades de Harvard, Yale e Princeton, além da Universidade da Califórnia em Los Angeles, onde atuou por duas décadas ensinando sobre Renascimento italiano. Desde 2006, ele ocupa a cadeira de história cultural europeia na Escola Normal Superior de Pisa. Poliglota, tem viajado por várias universidades do mundo ministrando palestras, inclusive recorrentemente no Brasil.
Na multiplicidade de sua produção, ele tem publicado desde muito tempo, além de seus livros, uma diversidade de ensaios igualmente importantes em revistas científicas, tanto em termos de história propriamente como de análise da maneira de escrevê-la. Seus artigos podem ser encontrados, entre outras, nas revistas Past & Present, Annales, Quaderni Storici, Rivista Storica Italiana, Critical Inquiry e Elementa.
Como poucos ele tem uma leitura muito acessível. Ele "escreve história para leitores", para um público o mais amplo possível. Ou seja, não entende a escrita suficiente por si só, ou seja (mais uma vez), ele não se fecha em uma escrita impenetrável restrita a um círculo de iniciados, como fazem muitos acadêmicos. Como ele próprio diz, "sinto que estou constantemente envolvido em uma troca intelectual e, muitas vezes, quando termino uma sentença, imagino algum amigo reagindo ao que escrevi".
Os livros desse autor:
I benandanti. Stregoneria e culti agrari tra '500 e '600 (1966) / edição em português Os Andarilhos do Bem
Il nicodemismo. Simulazione e dissimulazione religiosa nell'Europa del '500 (1970)
Giochi di pazienza. Un seminario sul 'Beneficio di Cristo' (1975, publicado em colaboração com Adriano Prosperi)
Il formaggio e i vermi. Il cosmo di un mugnaio del '500 (1976) / edição em português O Queijo e os Vermes
Indagini su Piero. Il Battesimo, il ciclo di Arezzo, la Flagellazione di Urbino (1981) / Investigando Piero
Miti emblemi spie (1986) / edição em português Mitos, Emblemas e Sinais
Storia notturna. Una decifrazione del sabba (1989) / edição em português História Noturna
Il giudice e lo storico. Considerazioni in margine al processo Sofri (1991) / edição em inglês Judge And The Historian
Occhiacci di legno. Nove riflessioni sulla distanza (1998) / edição em português Olhos de Madeira
History, Rhetoric, and Proof. The Menachem Stern Jerusalem Lectures (1999)
Das Schwert und die Glühbirne. Eine neue Lektüre von Picassos Guernica (1999)
No Island is an Island. Four Glances at English Literature in a World Perspective (2000) / edição em português Nenhuma Ilha é Uma Ilha
Tentativas (2003)
Un dialogo (2003, publicado em colaboração com Vittorio Foa)
Rekishi o Sakanadeni Yomu (2003)
Il filo e le tracce. Vero falso finto (2006) / edição em português O Fio e os Rastros
Paura, reverenza, terrore. Rileggere Hobbes oggi (2008) / edição em português Medo, Reverência, Terror
Nondimanco. Machiavelli, Pascal (2018)
Livro destaque desse autor:
O Queijo e os Vermes
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* originalmente postado em 18/mar./2020
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